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sábado, 26 de abril de 2008

Conheça os alimentos que podem acabar desaparecendo do planeta

Exploração descontrolada coloca em risco atum, bacalhau e outros peixes nobres.
Descaso com variedades tradicionais de plantas e animais também é ameaça.
Publicitários sem muita consciência ambiental poderiam muito bem criar placas com os dizeres "Coma antes que acabe" e distribuí-las pela seção de frutos do mar dos supermercados mundo afora. O humor negro seria justificado: peixes e assemelhados estão entre as principais fontes de alimento com risco de desaparecer da Terra, graças principalmente à coleta irresponsável.

Foto: Reprodução
O bacalhau-do-atlântico (Gadus morhua) em seu ambiente natural (Foto: Reprodução)


Mas eles certamente não estão sozinhos. O perigo de sumir do mapa também ronda boa parte das variedades tradicionais de plantas e animais domésticos do mundo, bem como seus parentes mais próximos que ainda existem em estado selvagem. Há uma tendência preocupante de substituição dessa variabilidade por umas poucas raças e cultivares comerciais. Não é só o paladar, necessariamente menos diversificado, que perde com isso: as variantes tradicionais e silvestres guardam genes importantes para rusticidade, resistência a doenças e até produtividade. Seria burrice jogá-las fora -- mas é o que está acontecendo.


Redes gulosas

A julgar por um estudo recente, coordenado por Stephen R. Palumbi, da Universidade Stanford (EUA), a situação nunca esteve tão negra para quem gosta de um bom peixe. Se tudo continuar como está, calculam Palumbi e seus companheiros, nenhuma das espécies marinhas exploradas comercialmente hoje estará disponível para consumo humano em 2050.

Os cálculos dos pesquisadores sugerem que quase metade dessas espécies já perdeu 90% ou mais de sua população. Desde 1994, quando o mundo atingiu o pico de capturas pesqueiras, a quantidade de peixes efetivamente pescados só tem diminuído. E as principais vítimas são justamente os mais nobres, como o atum-azul e o bacalhau -- no caso do primeiro, a população total da espécie decaiu 92% desde os anos 1950.

O grande problema relacionado à pesca intensiva desses animais é o nicho ecológico que eles ocupam -- eles são todos grandes predadores de crescimento lento, o que aumenta em muito a dificuldade de manter suas populações. Em termos terrestres, comer bacalhau ou atum seria como criar leões para fazer hambúrguer -- os bichos teriam de comer carne de vacas, as quais, por sua vez, precisariam de pasto. É um processo extremamente ineficiente.

Foto: Reprodução
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Fungo conhecido como sigatoka-negra assusta produtores de banana (Foto: Reprodução )
Diversidade genética em baixa

Anos atrás, o cientista belga Émile Frison lançou o alerta de que a banana-nanica poderia desaparecer do planeta se os parasitas que afetam a fruta, como o fungo sigatoka-negra, não fossem combatidos urgentemente com novas técnicas. A situação, embora exagerada pelo pesquisador, é realmente grave. A banana é basicamente um clone, o que significa baixa variedade genética e maior vulnerabilidade a doenças. Embora outras plantas e animais domésticos não sejam clones, riscos parecidos os aguardam, especialmente porque sua variabilidade genética tem encolhido graças ao domínio de poucas raças e variedades comerciais.

Esse processo pode acabar se revelando um péssimo negócio para o Brasil, afirma Arthur Mariante, líder do projeto de conservação e uso de recursos genéticos animais da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). "No caso das raças tradicionais de gado trazidas para o Brasil pelos portugueses e espanhóis, vamos perder 500 anos de seleção natural e adaptação às condições do nosso território", declarou Mariante ao G1.

Explica-se: embora os colonizadores não praticassem o melhoramento intensivo de raças, bichos como bovinos, ovinos e suínos, entre outros, assumiram características específicas para sobreviver nos ambientes das várias regiões do Brasil. Além de serem rústicas -- capazes de ganhar peso mesmo com alimentação não-reforçada e de resistir melhor a doenças --, as raças tradicionais também podem ser muito produtivas, diz o pesquisador da Embrapa.

Nicho de mercado

"A vaca curraleira [raça típica do Nordeste], por exemplo, produz um bezerro por ano, e isso durante décadas, enquanto raças européias ou os zebus precisam alternar", conta Mariante. "O caracu [bovino tradicional de São Paulo] muitas vezes bate outras raças em competições de ganho de peso."

"Essas raças certamente conseguiram achar um nicho ecológico aqui no Brasil. O que a gente precisa fazer agora é achar um nicho de mercado para elas", diz o pesquisador. Os produtores do Nordeste, por exemplo, costumam afirmar que poucas carnes se comparam, em sabor e maciez, à do gado curraleiro. O Brasil, embora seja um grande exportador de carne bovina, ainda fica atrás em termos de carne de alta qualidade, nicho que poderia ser suprido pelo curraleiro.

Foto: Arthur Mariante/Divulgação
Touro curraleiro: segundo produtores nordestinos, a maciez da carne é incomparável (Foto: Arthur Mariante/Divulgação)

Outra possível saída para as raças tradicionais de suínos do Brasil, muito usadas no passado para a produção de banha, seria direcioná-los para a fabricação de presuntos finos, como os feitos hoje na Espanha e em Portugal. "Os consumidores europeus estão cada vez mais preocupados com o bem-estar animal, dando valor às carnes produzidas com os animais soltos. Os nossos suínos agüentam muito bem esse tipo de criação, enquanto as raças estrangeiras não. É um caminho interessante para valorizar essas raças", diz Mariante.

Mandioca a perigo

Não há sinais de que a mandioca, um dos alimentos mais populares do Brasil, vá sumir das mesas. No entanto, levantamentos feitos pelo biólogo Nagib Nassar, da Universidade de Brasília (UnB), mostram que recursos genéticos importantes para a planta estão sendo perdidos.

Nassar estuda os centros de diversidade dos parentes selvagens da mandioca, localizados no cerrado do Centro-Oeste brasileiro. Ele visita a região desde os anos 1970 e diz que pelo menos três espécies podem ter se extinguido. A perda é importante porque as formas selvagens da planta são mais rústicas e possuem teor mais alto de proteínas, vantagens que poderiam ser trazidas para a mandioca doméstica por meio de cruzamentos ou engenharia genética

Em maior ou menor grau, o problema acontece com os parentes selvagens de boa parte das plantas utilizadas comercialmente, como o milho e o trigo.

www.g1.com.br

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