Atualmente, o principal campo de batalhas entre a preservação ambiental e o crescimento econômico fica em Rondônia. É nesse Estado que corre o rio Madeira e, com suas águas, o governo pretende construir duas hidrelétricas - a Jirau e a Santo Antônio - que seriam capazes de produzir 6.450 megawatts (MW). Assim, cumpriria mais da metade da meta do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) de aumentar a oferta de energia elétrica em 12.300 MW até 2010. Segundo o governo, tal volume é essencial para afastar o risco de apagão caso a economia passe a crescer 5% ao ano daqui há quatro anos: o grande projeto do segundo mandato do presidente Lula.
No entanto, devido a uma série de falhas no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) a licença está empacada no Ibama. Para se ter uma idéia do drama, parecer técnico do órgão, divulgado dia 23 de abril, concluiu que não é possível atestar a viabilidade ambiental da obra, pois o EIA subdimensiona as áreas impactadas pela hidrelétrica. Disso decorrem problemas como, por exemplo, refazer a análise dos impactos do empreendimento em territórios fora da soberania nacional. Ou seja, os técnicos estimam que o lago formado pela construção pode inundar até mesmo regiões da Bolívia e do Peru.
De seu lado, o engenheiro Célio Bermann, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP), parece ter a solução. No artigo “Impasses e Controvérsias da Hidreletricidade”, publicado na última edição da Revista Estudos Avançados, ele garante que o país não precisa construir mais nenhuma usina para atingir a meta do PAC.
Segundo Bermann, trocando as turbinas das cerca de 70 hidrelétricas com mais de 20 anos que existem no Brasil, poderia-se gerar 8.000 MW a mais. Para chegar aos 12.300 MW previstos no PAC, bastaria reduzir o desperdício nas linhas de transmissão que hoje é de 15%, para 10%. Assim, o país contaria com outros 4.500 MW de energia.
Interesses escusos
De todo modo, a produção de megawatts pode não ser o único objetivo da construção das hidrelétricas Jirau e Santo Antônio. Segundo o jornalista e pesquisador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) Carlos Tautz, uma articulação política e empresarial para emplacar a obra vem atuando desde o segundo semestre de 2006.
Em artigo publicado, no dia 30 de abril, no site Envolverde, Tautz revela que esse acordo envolvia os formuladores dos programas de governo de Geraldo Alckmin e de Lula, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Sociais (BNDES), o Ibama, Furnas, a empreiteira Odebrecht e respeitados professores universitários. O objetivo era fabricar um consenso sobre a necessidade de construir as hidrelétricas.
De acordo com Tautz, o que ele chama de “Operação Madeira” transcorreu da seguinte forma: “1) O Ibama, após meses de questionamentos por parte de ambientalistas, aprovou licenças preliminares para as obras e marcou as audiências públicas para discutir um pré-EIA; 2) a construção das usinas entrou no programa de governo de Lula. Alckmin fez o mesmo; 3) o BNDES, único financiador de longo prazo no Brasil para obras de infra-estrutura, reduziu suas taxas para projetos de geração e transmissão de energia. Sintomaticamente, deixou de fora a área da distribuição de energia, que não está diretamente envolvida no projeto do Madeira; e 4) Furnas & Odebrecht tentam angariar na sociedade apoio para a obra”.
A obra está orçada em R$ 20 bilhões e os seus defensores esperam que a oferta de energia induza à construção de um grande pólo agroindustrial. Além disso, “tanta eletricidade demandaria a utilização de 30 milhões de hectares” de terra, numa área que o Ministério do Meio Ambiente considera prioritária para a preservação.
Para completar o esquema, Tautz prevê como “uma outra possibilidade forte a criação de um grande lago artificial e de uma enorme hidrovia, por onde as commodities agrícolas produzidas pelo complexo agroindustrial seriam transportadas até atingirem portos marítimos, de onde iriam para grandes importadores de bens primários”.
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